por Priscila Gutierres
1. Resumo
Nesse texto discutiremos algumas das visões que seriam possíveis de ser adotadas e levariam a uma implicação determinista e os erros em que recaem.
2. Noções Preliminares
2.1 Computabilidade
Uma função é computável se existe ao menos uma regra explícita e definida segundo a qual, a seguindo, podemos em princípio calcular o seu valor para um número finito de argumentos. Uma definição rigorosa pode ser encontrada na Referência (1), onde é definida a noção de uma função computável em uma máquina de Turing.
2.2 Determinismo
A partir do dicionário de Filosofia de Cambridge, encontramos o seguinte verbete para determinismo.
“Contemporary determinists do not believe that Newtonian physics is the supreme theory. Some do not even believe that all theories will someday be integrated into a unified theory. They do believe that, for each event, no matter how precisely described, there is some theory or system of laws such that the occurrence of that event under that description is derivable from those laws together with information about the prior state of the system.Some determinists formulate the doctrine somewhat differently: (a) every event has a sufficient cause; (b) at any given time, given the past, only one future is possible; (c) given knowledge of all antecedent conditions and all laws of nature, an agent could predict at any given time the precise subsequent history of the universe.”
2.3 Problemas P e NP
“The P versus NP problem is to determine whether every language accepted by some nondeterministic algorithm in polynomial time is also accepted by some (deterministic) algorithm in polynomial time. To define the problem precisely it is necessary to give a formal model of a computer. The standard computer model in computability theory is the Turing machine, introduced by Alan Turing in 1936 [Tur36]. Although the model was introduced before physical computers were built, it nevertheless continues to be accepted as the proper computer model for the purpose of defining the notion of computable function.”
Ver referência (1)
2.4 Mecânica Quântica
” Quantum mechanics is a set of principles underlying the most fundamental known description of all physical systems at the submicroscopic scale (at the atomic level). Notable among these principles are both a dual wave-like and particle-like behavior of matter and radiation, and prediction of probabilities in situations where classical physics predicts certainties.”
Ver referência (2)
3. Abordagens Discutidas
Necessariamente o determinismo implica a presvisibilidade de um sistema?
3.1. Previsibilidade x Imprevisibilidade
Nesse texto tentarei destituir qualquer erro conceitual a respeito de determinismo que possivelmente poderia levar a sua não-aceitação, e as consequencias da Teoria do Caos à definição dada de Determinismo.
3.1.1. Concepção Laplaceana:
Citação de Laplace:
“ We may regard the present state of the universe as the effect of its past and the cause of its future. An intellect which at a certain moment would know all forces that set nature in motion, and all positions of all items of which nature is composed, if this intellect were also vast enough to submit these data to analysis, it would embrace in a single formula the movements of the greatest bodies of the universe and those of the tiniest atom; for such an intellect nothing would be uncertain and the future just like the past would be present before its eyes. “
Com base nisso, podemos dar a seguinte definição para solucionar o problema acima:
–
Definição:
Seja um sistema S cuja solução seja dada pelas condições iniciais do sistema S, para t > 0. O sistema S é necessariamente linear e o sistema de suas equações é possível e determinado.
–
Supondo que o sistema represente uma família de vetores em um Espaço Vetorial V, sabemos que que dadas as condições iniciais do sistema, existe apenas um vetor v pertencente a V que satisfaz as condições iniciais do sistema.
A linearidade do sistema é uma condição necessária para que haja previsibilidade, e mais a diante veremos o porquê.
3.1.2. Teoria do Caos
3.1.2.1 A teoria do caos descreve sistemas dinâmicos, muito sensíveis às condições iniciais do sistema. Como resultado, ele apresenta um nível de crescimento exponencial de perturbações em relação as condições iniciais o que faz com que os sistemas caóticos se pareçam com sistemas randômicos. Vejamos porquê.
A equação logística é um simples exemplo de um sistema dinâmico. Matematicamente,
X_(t+1) = k X_t (1 – X_t), é a equação logística.
onde t pertence a N, X_o a condição inicial do sistema dada, k é um parâmetro dado e X_t é a condição do sistema anterior a X_(t+1).
Consideremos a evolução do sistemas ao longo de t= 1, … ,n:
X_1 = k X_o (1 – X_o)
X_2 = k (k X_o (1 – X_o)) (1 – (k X_0 (1 – X_o)))
…..
Observamos que com a evolução de t, a expressão fica muito grande, assim como a potência de k.
Três regimes são possíveis a dependem do valor que se atribua ao parâmetro k:
a) Ponto fixo
Um sistema está em regime de ponto fixo se, e somente se:
Se t -> mais infinito e lim t-> mais infinito X_t = L, L pertencente a R,para uma certa faixa de valores pequenos de k.
Ou seja, o valor de X(t) tenderá para um limite finito e permanescerá assim nas iterações ulteriores.
b) Bifurcação
Para k maiores, também em uma certa faixa, em iterações sucessivas temos uma oscilação entre 2 valores. Se o k for um pouco maior que isso, temos oscilação em 8, 16, .. , generalizando em 2^(i+3), i pertencente a N valores. É o regime das sucessivas bifurcações e duplicações de período.
c) Caos
Para valores extremamente grandes de k será completamente impossível prever o comportamento do sistema!
Tomemos k extremamente grande. Tomemos um sistema X_t e outro X_T’, com valores inicias respectivamente iguais a X_o e X_o’ e k iguais.Para um dado valor inicial X_o, se tomarmos X_o’ com apenas o último digito de precisão diferente, não poderemos inferir X_t a partir de X_t’. Por isso, dizemos que sistemas dinâmicos são muito sensíveis as condições iniciais do sistema.
No regime do caos, a imprevisibilidade é um dado de princípio para qualquer que seja o grau finito das condições iniciais.
1.2.2 Complexidade
Intuitivamente, podemos dizer a complexidade varia de acordo com a iteração das variáveis de um sistema, isto é, está diretamente ligada a ela. Ou seja, podemos dizer que quanto maior a flutuação das variáveis do sistema e o o grau de interconexão entre elas, o sistema em estudo será mais complexo. Em um sistema não linear a complexidade tende a crescer exponencialmente, dificultando qualquer tipo de previsão . Por isso a necessidade de linearidade para que necessariamente umsistema possa ser previsível em qualquer ponto de seu domínio.
Disto concluimos que a aparente aleatoriedade de um sistema dinâmico em regime de caos se dá pela imprevisibilidade do sistema, ainda que esta [a aleatoriedade] não exista.
3.2. Determinismo
Adotando a seguinte definição de determinismo (da Wikipédia):
Determinismo é a proposição filosófica de que todo evento, incluindo a consciência e comportamento humana, decisão ou ato, é casualmente determinada por uma corrente interminável de ocorrências anteriores. Descuidando-se das possíveis armadilhas semânticas que a definição acima pode ter, a partir do que foi desenvolvido anteriormente podemos concluir algumas coisas. Ora, na definição anterior excluímos a necessidade de previsibilidade do sistema, que faz parte do conceito intuitivo.
Se analisarmos 1.1 não é difícil encontrar um contra-exemplo, podemos citar mesmo casos particulares da Mecânica Quântica. Mas, já excluído o caráter de previsibilidade da condição de existência,em 1.2 encontramos um modelo que se adequa perfeitamente ao determinismo do modo como foi postulado.
Afirmada a consistência da Teoria do Caos no nosso mundo físico, é plausível conceber o determinismo com todos os fenômenos existentes e reduzíveis a ele. Portanto, não mais seria possível utilizar exemplos da Mecânica Quântica ou de qualquer outra área que a princípio parece ser um paradoxo ao determinismo.
4. A Crítica
A crítica será direcionada ao segundo texto apresentado (abordagem utilizando sistemas dinâmicos), sabendo-se que a crítica a concepção laplaceana pode ser perfeitamente tirada como um corolário do que segue abaixo.
O texto tentou demonstrar que a realidade é estritamente determinada. Porém, a primeira coisa a salientar a respeito do desenvolvimento, é a natureza dos problemas estudados. Podemos em primeira instância classificar os problemas em três tipos: os problemas possíveis de serem resolvidos analiticamente ou numericamente e os não-solúveis. Na primeira categoria, temos os problemas a partir da qual podemos encontrar uma solução analítica e a partir dai ter uma idéia razoável de como ele irá se comportar. Já o segundo tipo de problema, precisamos calcular numericamente, frequentemente usando técnicas de integração numérica, a solução do problema para um dado número finito de argumentos. O terceiro problema se encaixa nos problemas indecidíveis, como por exemplo o problema da ‘halting machine’. Assim, conclui-se que há uma solução analítica e solúvel em tempo polinomial para todos os sistemas físicos.
Mais que isso, analisando o contexto do texto e supondo que P=NP, condição necessária para a validade da sugestão que ele faz,seria quase impraticável a análise experimental de um sistema dinâmico uma vez que supondo a variação do sistema se de em um intervalo de tempo dt e as condições iniciais variando em intervalos infinitesimais também, teríamos uma imprecisão muito grande o que faria com que uma análise experimental estivesse fadada ao fracasso. Uma sugestão para esse problema específico seria parametrizar o sistema em uma máquina de turing em função de outros parâmetros que não seja o tempo, que é exatamente o parâmetro utilizado para caracterizar um sistema dinâmico. Por exemplo, supondo S¹ um sistema que descreve o sistema em um intervalo dt real teríamos um número infinito de sucessivas interações, o que impossibilitaria uma análise experimental consistente e precisa.
Do que foi exposto até agora, podemos dizer que as duas visões apresentadas no textos estão erradas. A primeira, porque assume que o mundo físico é determinado por equações lineares, e assim computáveis. A segunda, porque assume disfarçadamente a mesma postura, mas desta vez postulando que P=NP.
Tangenciando a questão filosófica de determinismo, podemos afirmar que, de acordo com o verbete extraído do dicionário filosófico de Cambridge, a noção dada no texto assume a visão do item (b) e portanto está correta.
Já em relação à Mecânica Quântica, tudo o que temos do sistema é uma distribuição de probabilidades do estado do mesmo, o que a princípio não elimina a possibilidade desse ter um estado determinado.
5. Conclusão
O problema está em aberto. É impossível através da abordagem adotada anteriormente provar a determinação do mundo físico. Talvez alguma outra abordagem dê conta de encontrar argumentos a favor, ou quem sabe, contra.
5. Referências
(1) http://www.claymath.org/millennium/P_vs_NP/Official_Problem_Description.pdf
(2) http://en.wikipedia.org/wiki/Quantum_mechanics