Esse post é um adendo do anterior.
E aqui quero tratar de duas questões distintas mas interligadas. A primeira é o standing moral de Israel. De sua orígem, de suas ações,de sua própria existência.
Em segundo lugar quero tratar de sua capacidade de existir continuada.
Começo com a primeira falando que sou um convicto anti-zionista. A idéia de pegar um povo mutilado e massacrado e enxertar em uma terra com donos e especialmente disputada e valiosa, é nada menos que imbecil. Dou um desconto para aqueles judeus que saídos de campos e da Europa em geral viram a necessidade de um estado próprio. Realmente os ventos ainda não eram favoráveis em lugar algum. É por isso que o mundo inteiro devia ter vetado essa empreitada estúpida, assim como fariamos no mais que fabular cenário de levar os pobres sudaneses afligidos por uma guerra étnica terrível e metermo-los em Manhattan, deixando o Brooklin para os nativos.
Mesmo assim, até hoje discordava de uma resolução da ONU que esteve em vigor por muito tempo e que equacionava o zionismo ao racismo. Em meus argumentos anteriores constava o fato de que Israel deu cidadania a muitos palestinos, em Jerusalem por exemplo, nas colinas de Golã, etc. Além disso tem 20% de árabes em seu parlamento. Não é como se a África do Sul tivesse negros no parlamento ou ministérios.
Alguns fatos já perturbavam essa opinião, como o fato de que árabes de facto não podem renovar suas construções em Jerusalem, e caso se mudem de Jerusalem, perdem o direito de ir morar ali. Há sim, portanto, cidadãos de segunda classe. Varias outras instituições garantem que a posse de terras, entre outros, sejam cuidadosamente alocados em mãos judias.
Mas foi a leitura do livro do Chomsky, chamado Piratas e Emperadores, que me fez concordar com a tal resolução. Não há racional possível para o estado de Israel hoje que não precise se utilizar de alguma diferença qualitativa entre os estados Israelense e árabes, que não tenha um fundo racista. Elas são das mais variadas, e a mais leve é:
Israel é um estado democrático (pelas razões que já elenquei acima) de direito, ao contrário da pletora de estados ditatoriais e brutais que o cercam.-as vezes com o adendo: deixado à mão dos palestinos essa terra reverteria a um país atrasado.
-Um estado democrático não mantém regiões trancadas, sem direito a voto, de passagem, de protesto, de consciência e expressão. Pois essa é a paisagem nas desoladoras Gaza e Cisjordânia. Além disso, essa afirmação implica que uma etnia-árabe- é por natureza mais bruta ou selvagem, e/ou sua religião inferior, selvagem ou bárbara.(um rapido olhar sobre as praticas haredis judaicas já anula esse tipo de olhar superior)
-Além disso a falta de democracia ao seu redor foi Israel que ajudou a criar: O Libano, numa ação direta, alguns outros como reação indireta àquele corpo estranho.
Daí pra frente os argumentos só pioram, com teores religiosos- normalmente o velho Deus nos prometeu essa terra, ou explicitamente racistas.
A segunda parte dessa questão complicada da situação moral de Israel passa por um inventário relativizado de suas ações. Sobre isso indico a mesma leitura acima(só para estômagos fortes) e afirmo somente que deve ser incrivelmente triste para um sobrevivente do holocausto ver seus filhos se tornarem os algozes. E para Moisés, se esse ainda vê, ver a idolatria de uma faixa de terra se elevar acima de preceitos básicos como não matarás.
Sobre a questão imensamente mais complicada da existência continuada de Israel, acho aqui que essa nação não é viável a longo prazo. Falo isso sem considerar se é justa ou não a existência de Israel exceto onde a percepção do mundo ajude ou atrapalhe, pois em grande parte ele concorda comigo.
Na verdade as opiniões do mundo são as mais variadas. Os EUA tem uma devoção forte, fruto de décadas de propaganda favorável (consultar Chomsky sobre isso também), um alinhamento da teologia cristã com o apoio incondicional de Israel, e principalmente um forte apoio e influência política da enorme colonia judaica americana (~5 milhões). A Europa ocidental é defensora dos moldes clássicos do estado, pré 67, mas sua opinião pública guarda um razoável desagrado pelo desprezo Israelense a considerações humanitárias. Também odeiam a continua quebra de suas soberanias por agentes do Mossad. Já para o Leste, a partir da Austria, o anti-semitismo é forte, e na Russia, enorme. O resto dos países tende a se alinhar como a Europa ocidental (Brasil é especialmente vocal ai, mas Chile, Argentina, etc seguem).
Ponto de consenso é que brusca ou suavemente a participação dos EUA no mundo em todos os sentidos tende a diminuir. Em 46 os EUA detinham metade da economia mundial. Desde então essa proporção vem baixando, mesmo que eles mantém um crescimento saudável. Uma nova configuração do cenário internacional vai se montar, com o poder de barganha da Russia bastante aumentado, um EUA tentando lidar com sua decadência relativa, aumento do poder de Brasil e do cone sul em geral, com vozes de esquerda. O mundo árabe terá aumentado um pouco, concentradamente nos microestados da Arábia. Mas o petróleo continuará a ser uma grande peça de troca.
O importante é a ascenção da China e Rússia aqui, além da reversão da unipolaridade. Essas mudanças de que falo são lentas, e mesmo sem qualquer ameaça de bomba trocada, vão se operando nos varios foros de debate internacional, nas influências, nos programas de ajuda, intercâmbio. Ora, para qualquer país que considere somente relações comerciais, o pragmatismo chinês por excelência, o 1 bilhão de muçulmanos supera os dispersos, embora ricos, judeus, especialmente na questão do petróleo. Essa é uma posição que será gradualmente exercida pelo Japão, a medida que esse começar a ter opiniões mais próprias. Os árabes não são pragmáticos e são exclusivistas, e se tiverem mais poder de barganha (e com o óleo mais escasso, terão)usarão. Rússia, como disse, é provavelmente o país mais anti-semita e não se incomodaria em ver os chechenos perderem um de seus principais argumentos de revolta. A China tem um problema parecido com os Uigures. Uma consideração especial para a Igreja Católica, essa é fragmentária, mas tem lados flagrantemente anti-semitas. O papado, que importa no entendo, é de neutro para europeu.
Mesmo assim Israel ainda é uma economia dinâmica, com apoios bilionários ao redor do globo e o exercito de longe mais bem equipado da região. Além de bombas atômicas, que só o distante Paquistão pode rivalizar. E parte de sua população, boa parte, é fanática e não sairia dali a não ser morta. E o apoio dos EUA ainda serão massivos, mesmo que em 20 anos sua proporção da economia mundial baixe significativamente.
Por isso mesmo só pelo soft power se consumirá lentamente a economia e instituições do país. Mas internamente há dois grandes problemas.
-O primeiro é a polarização cada vez maior em torno dos assentamentos. Uma pequena parte dos israelenses vive nos assentamentos, que são enclaves em território além do de Israel (em busca de uma grande Israel, ou um Lebensraum. Qualquer semelhança é mera…), mas que geram a maior parte da confusão. Os Israelenses modernos e conscientes não acha certo servir em um exercito massacrando palestinos por causa de alguns fanáticos religiosos cuja idéia de constituição civil é o velho testamento. A polarização começou a chegar a tal ponto que a organização dos assentados agora retalia qualquer ataque palestino a um assentamento tanto nos palestinos como em organizações de paz. E a verdade é que essas organizações de paz e os israelenses modernos em geral são a cobertura e álibi de Israel no seu marketing internacional de Europa cravada no meio dos bárbaros. Quem se compadeceria dos radicais? Com os desafios externos aumentando, tanto econômicos quanto militares, essas tendências tendem a se exacerbar, e vislumbro até uma parte do movimento de paz e dos cosmopolitas israelenses emigrando. As duas israeis só coexistem na irmandade militar exigida de todos, e no sonho obsoleto de seus avós visionários. A visão parece cada vez menos realidade e talvez os netos e bisnetos desistam se a condição for a guerra incessante.
-Outro ponto fundamental são os árabes internos. Israel já tem 20% de árabes e uma proporção igual em seu parlamento, que no fundo acabaria com o estado, se tivesse o poder. A verdade é que as projeções demográficas projetam que essa proporção vá a 30% até 2020, o que inviabiliza um governo sem a participação deles quase, e torna um terço da população do estado inimigos deste. Com uma demografia assim, o país parece menos viável, e foi exatamente o que Ariel Sharon percebeu quando saiu de Gaza e tirou os assentamentos dali: seria inevitável dar direitos políticos dentro do estado de Israel aos habitantes daquele território, e eles só ajudariam a compor uma maioria de palestinos.
Ora, você poderia me dizer, e no caso de um processo de paz bem sucedido. muito do que eu disse não faria sentido.
Não acredito em um processo de paz por uma série de razões. A primeira é que a direita está muito forte em Israel, e tende a continuar e se radicalizar. Afora isso, os Palestinos ja perceberam essas tendências e advogam cada vez mais a saída do estado único, sabendo que se for concedido em poucos anos eles terão maioria e liberarão o direito de retorno, efetivamente acabando com Israel. Além disso Gaza e a Cisjordania estão divididas, e não há sequer um lider de centro em Israel com a mínima vontade política. O clima não é para paz em lugar nenhum. E o Hezbollah vai atirar misseis não importa o que.
Mas comentem por favor, que acham